Deputados, médicos, gestores de saúde estaduais e municipais, Ministério Público e academia, entre outros, debateram, na manhã desta quarta-feira, a falta de médicos no interior no Brasil, em audiência pública promovida pelo deputado estadual Gilberto Martin (PMDB), com o apoio da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa do Paraná. Todos os participantes do encontro destacaram a necessidade de se criar uma carreira de Estado para o SUS como a melhor ferramenta de fixar médicos nas regiões de mais difícil acesso.
No encontro, o presidente da Associação Médica do Paraná, João Carlos Baracho, apresentou os dados da Demografia Médica, censo realizado pelo Conselho Federal de Medicina, que mostra a distribuição de médicos no Brasil. “Temos 2 médicos para cada mil habitantes no País, a mesma média do Canadá e muito próxima de Japão e Estados Unidos. Ou seja, não faltam médicos no Brasil. O principal problema, é a distribuição. Os médicos estão concentrados onde estão localizados os equipamentos de saúde. Onde não há estrutura, não há médico”, disse o presidente da AMP, salientando que a criação de condições de trabalho e o estabelecimento de vínculo formal, com a carreira de médico do SUS, fixariam o médico no interior, sem a necessidade de atração de médicos estrangeiros. “Os médicos formados no exterior são bem-vindos, mas desde que comprovem capacidade para cuidar da saúde dos brasileiros”, reforçou.
O Presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná, Alexandre Gustavo Bley, falou sobre os motivos que levam os médicos a não se fixarem no interior. “A saúde passou a ser vista como um produto e a disposição de médicos ocorre de acordo com o capital, dentro de uma regra de mercado. Falta respeito com os profissionais, falta financiamento, falta condições de trabalho, como estrutura, equipamentos, medicamentos, sendo que muitas vezes o profissional acaba levando a culpa por algo que não compete a ele”, disse Alexandre Bley. Em sua apresentação, o presidente do CRM expôs fotos e citando exemplos de problemas enfrentados por médicos em postos de saúde no interior do Brasil, citando inclusive a falta de macas e cadeiras para os pacientes internados. “É preciso, por parte do Governo Estadual e, principalmente, Federal, a iniciativa da criação de uma carreira para os profissionais, de forma que eles tenham mais perspectiva de crescimento e condições de trabalho dignas. Isso serviria de atrativo para levar o médico a se fixar no interior”, ponderou. Por fim, Alexandre Bley comentou a importância de levar o assunto ao conhecimento da sociedade, para que a população como um todo saiba das dificuldades enfrentadas pelos profissionais de saúde, já que muitas vezes essa dificuldade tem interpretações equivocadas e diferentes da realidade.
Já o diretor da Federação Nacional dos Médicos e do Sindicato dos Médicos no Paraná, Mário Ferrari, apresentou a proposta de carreira de Estado de médico do SUS, elaborada pela Fundação Getúlio Vargas, sob requisição das entidades médicas nacionais. “Se hoje os municípios esbarram na Lei de Responsabilidade Fiscal e no limitador do salário do prefeito para contratar médicos, e acabam tendo que terceirizar a atenção à saúde, precarizando a situação de trabalho do médico, a solução está na carreira, como temos no Judiciário, no Ministério Público, na Receita Estadual e Federal, entre outras carreiras”, disse.
Como contraponto, o médico de saúde da família e professor da Universidade Federal do Paraná, Francisco Carlos Mouzinho de Oliveira, explicou os estudos do Governo Federal para trazer médicos estrangeiros no Brasil. “O Ministério da Saúde está estudando estratégias complementares. Não está definido, de forma alguma, e acabou saindo na imprensa por intermédio do ministro das Relações Exteriores. O médico teria que se submeter a validação do diploma e pode trabalhar em qualquer lugar que seja, fazendo o revalida ou o médico participa de um programa para trabalhar em atuação restrita em áreas de escassez de médicos”, argumentou. De acordo com ele, o Brasil gerou 55 mil postos de trabalho a mais do que a formação de médicos nos últimos 10 anos.
Para o procurador de justiça e promotor público, Marco Antônio Teixeira, a discussão fundamental está no direito de atendimento à saúde da população. “A questão da falta de médicos nos reflete a república da saúde, não estamos falando da área da privada. Precisamos localizar bem a discussão”, enfatizou. Teixeira também ressaltou que o problema não é a remuneração. Citou exemplo de ofertas de serviço com salários de R$ 20 mil que não são preenchidas. “Não adianta se o médico senta na sua mesa, atende o paciente mas não tem uma farmácia na sua retaguarda, não tem um posto, não tem rede, não tem referência, não tem ambulância e não tem nada”, completou.
Da audiência, será produzido um documento oficial a ser encaminhado ao Ministério da Saúde. “Mas, diante de todos os pontos de vista que ouvimos aqui, uma coisa é unânime e clara: a necessidade de uma carreira de Estado para o SUS, é nisso que nós deputados devemos nos concentrar”, disse Gilberto Martin.